
A história do armamento no Brasil é, ao mesmo tempo, uma história de Estado e de sociedade. Desde os primeiros tempos da colonização, o uso de armas esteve diretamente ligado à formação do território, ao exercício do poder local e à defesa individual diante da ausência de uma estrutura estatal consolidada.
O armamento civil, longe de ser exceção, foi regra durante boa parte da história brasileira — moldando comportamentos, políticas e relações sociais.
Do período colonial à arma como instrumento de poder
Durante a colonização portuguesa, o armamento teve papel decisivo na expansão territorial. Os bandeirantes armavam-se para explorar o interior e subjugar populações indígenas, enquanto senhores de engenho e capitães do mato utilizavam armas para manter a ordem nas fazendas escravistas. A falta de presença efetiva do Estado nas regiões mais remotas fez com que a autodefesa se tornasse uma prática aceita e, muitas vezes, incentivada.
Armas como bacamartes e facas de ponta eram comuns no cotidiano do sertão. Não era incomum que disputas por terras, dívidas ou questões políticas fossem resolvidas por meios violentos — cenário que se estendeu até as chamadas “eleições do cacete” no século XIX, quando confrontos físicos e armados decidiam o rumo da política local.
Império: porte legitimado e leis ineficazes
No Brasil Imperial, o porte de armas era visto por muitos como um direito essencial, sobretudo diante da insegurança urbana e rural. Mesmo após leis como a de 1831, que criminalizava o porte sem autorização, a aplicação era precária e raramente respeitada. Parlamentares e figuras públicas frequentemente declaravam portar armas em espaços públicos, como teatros e praças.
A cultura armamentista estava profundamente arraigada, funcionando como símbolo de autonomia e mecanismo de justiça privada — especialmente em uma sociedade marcada por desigualdade, lentidão judicial e insegurança.
República, revoltas civis e manutenção da prática armada
Com a chegada da República, o panorama não mudou de forma substancial. Revoltas como Canudos e Contestado revelaram a força de grupos civis armados em confrontos diretos com o Exército, desafiando a autoridade do Estado. Tentativas de restrição, como a proposta do então presidente Arthur Bernardes em 1925, fracassaram diante da resistência cultural à ideia de desarmamento.
Durante a Era Vargas, houve uma tentativa de enfraquecer o poder das oligarquias armadas. Ainda assim, episódios como o atentado contra Carlos Lacerda, em 1954, e a trajetória política de figuras como Tenório Cavalcanti mostram que o armamento seguia presente na política e no cotidiano.
A escalada urbana e o endurecimento das regras
Nas décadas de 1980 e 1990, com o crescimento da violência urbana, a proliferação de armas passou a ser vista com mais preocupação. Armas eram vendidas em lojas comuns e, muitas vezes, acabavam desviadas para o crime. Organizações como o Viva Rio denunciaram que boa parte das armas apreendidas em ações policiais vinha do mercado legal.
Essa mobilização levou à criação do Estatuto do Desarmamento, em 2003, que restringiu severamente a posse e o porte de armas, instituiu campanhas de recolhimento e trouxe maior rigidez nos registros e fiscalizações.
A recente reviravolta e nova tentativa de controle
A partir de 2019, o país vivenciou uma série de decretos que flexibilizaram as regras para CACs, ampliaram o número de armas e munições permitidas e reduziram o controle sobre o armazenamento e a circulação de armamentos. Essa mudança foi alvo de debates e ações judiciais, especialmente diante da polarização política em torno da questão.
Em 2023, um novo decreto federal reverteu parte dessa flexibilização, impondo limites mais rígidos, transferindo o controle para a Polícia Federal e proibindo, por exemplo, o porte de trânsito municiado para CACs. O governo atual argumenta que a medida visa coibir abusos e garantir que o uso de armas permaneça dentro de critérios técnicos e legais.
A história do armamento no Brasil é, portanto, marcada por ciclos de liberalidade e contenção, refletindo os conflitos e transformações da própria sociedade, conclui a loja Casa do Pescador e Militar, de Taguatinga (DF).
Para saber mais sobre a história do armamento no Brasil, acesse:
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